Desenvolvedores devem ser tratados como voluntários

Hoje, deixaremos os assuntos técnicos de lado e discutiremos um tema motivacional. O objetivo desse artigo é apresentar uma perspectiva alternativa sobre o comprometimento dos desenvolvedores e a motivação que os leva a desempenhar um bom trabalho. Afinal, desenvolvedores desmotivados é um aspecto comum nas empresas de desenvolvimento, não é? Por quê?

Todo desenvolvedor inicia um novo emprego motivado. Caso contrário, ele nem teria se candidatado à vaga. Porém, o que faz um desenvolvedor desistir de uma empresa e procurar novas oportunidades? Para buscar a explicação, em primeiro lugar, vamos contextualizar o ambiente de trabalho…

Imagem via Shutterstock

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carrot-and-stick-approachUma característica relativamente comum nas empresas de desenvolvimento de software é o prazo apertado, acompanhado da pressão no trabalho, cobranças e horas extras. Isso, por si só, já é desmotivador. Qualquer desenvolvedor que se submete a longas jornadas de trabalho tende a se sentir desconfortável com o trabalho e, consequentemente, com a empresa. Logo, começam as buscas por novas oportunidades. A empresa, para não perdê-lo, oferece benefícios ou promessas de promoção de cargo caso conclua o trabalho com sucesso. Isso geralmente é conhecido como “carrot and stick approach”, ou, traduzindo, a “abordagem da cenoura pendurada na vara”, conforme ilustra a imagem ao lado.

Essa imagem não traz nenhum aspecto positivo, não é? Se isso ocorre na empresa, há um problema, e dos grandes. Não é esse tipo de “incentivo” que levará o desenvolvedor a sempre realizar um trabalho satisfatório, simplesmente pelo fato de que não passa de um estímulo temporário.

A conversa aqui é outra. Falaremos, definitivamente, sobre motivação, no sentido literal da palavra.

Em primeiro lugar, atente-se ao fato de que o desenvolvedor comparece à empresa todos os dias e, na maioria das vezes, não é meramente para ganhar o salário no final do mês. O objetivo é fazer a diferença. Terminar a Sprint com todas as user stories movidas para a coluna “Done”. Bater no peito e garantir que o cliente ficará satisfeito com as novas funcionalidades corrigidas ou implementadas no software. Trata-se de uma questão de sentimento, e não de materialismo. Na realidade, é o mesmo sentimento de um voluntário que ajuda uma causa sem interesse próprio, mas, no caso dos desenvolvedores, é um ambiente corporativo.

Prometer aumentos não é a iniciativa correta. Incentivá-los por um tempo é fácil, mas mantê-los sempre incentivados é o grande desafio. Para que isso aconteça, é preciso que o desenvolvedor se sinta parte do objetivo principal da empresa.

Opa, mencionei a palavra “voluntário”! Faremos, então, uma reflexão. Como você trataria um voluntário?

Suponha que você esteja arrecadando fundos para ajudar uma causa e alguém se oferece para ser voluntário, fazendo o trabalho de divulgação da arrecadação nas mídias. Pois bem, já que essa pessoa, de bom agrado, se dispôs a ajudar, faríamos o possível para apoiá-la, não é? Forneceríamos recursos, informações e a atenderíamos sempre quando necessário. É assim que grupos de estudos são organizados, partidas de futebol são combinadas e festas são planejadas. Até mesmo aquele churrasquinho no final de semana depende de alguns voluntários para passar no supermercado para comprar os produtos. Todos esses exemplos demonstram pessoas que se prontificam porque gostam, ou melhor, porque sabem que, quando tudo estiver pronto, elas fizeram parte do processo.

Agora, tente encaixar esse conjunto de ideias em uma equipe de desenvolvimento. Se os desenvolvedores se comportassem como voluntários, dispostos e entusiasmados com os resultados, nem a user story mais “desagradável” seria párea para deixá-los desmotivados, afinal, o que importa é o sentimento de ter cumprido uma missão.

Tratar os desenvolvedores como voluntários significa empenhá-los para querer fazer o que eles têm para fazer, evitando pensamentos como: “Aaaah, eu vou ter que fazer isso? Pff… isso é chato pra caramba!”.

Na realidade, todos sabem que nunca haverá somente tarefas simples para realizar, mas, se os membros de uma equipe compreenderem que mesmo as tarefas enfadonhas são parte de um grande objetivo em comum, eles encontrarão motivação para realizá-las. Pode-se afirmar, então, que quando um desenvolvedor está desmotivado, significa que ele ainda não está se sentindo parte da solução.

Observe que tudo faz sentido. Desmotivação é a base da indisposição. Quer uma prova disso? A longo prazo, o custo de um desenvolvedor desmotivado será bem mais alto do que o custo de uma funcionalidade não implementada na versão do software.

Esse é o segredo. A empresa deve remover todos os obstáculos que causam desmotivação na equipe. Se uma funcionalidade é muito difícil de ser implementada, quebre-a em partes menores e compartilhe o trabalho com toda a equipe, de modo que não fique cansativo para ninguém. No entanto, é importante que as atividades também não fiquem “fáceis demais”, pois, assim como o trabalho excessivo, monotonia também é desmotivador. Desenvolver softwares é uma arte desafiadora que se torna gratificante quando conseguimos realizá-la com maestria. Isso produz uma sensação de conquista.

Além disso, é fundamental destacar a importância da entrega de valor e melhoria contínua, ao invés de cobrar métricas extensas, reuniões maçantes e cobranças diárias. Pressão causa desmotivação. Apontar a culpa também causa desmotivação. Ninguém mais consegue desempenhar um trabalho bem feito se não tiver ofeeling de estar prestando um favor. Da mesma forma que nos comportamos como voluntários, gostaríamos de ser considerados como tais.
Importar-se com a vida pessoal de cada desenvolvedor também é primordial, pois, às vezes, a desmotivação pode ser externa. Portanto, se um desenvolvedor chegar atrasado, procure compreender o motivo, e não criticá-lo pela imprudência.

E, talvez, o mais importante: comemorar o sucesso, por menor que seja. Desenvolvedores devem sentir orgulho do próprio trabalho, principalmente quando os resultados são altamente positivos. Chamá-los para um almoço ou um happy hour são ideias já conhecidas, mas… quer saber mesmo? Muitas vezes, desenvolvedores sentem falta de um simples “parabéns” acompanhado de um aperto de mão. É o mínimo que se espera, e infelizmente é o que menos acontece.

E então, vamos apoiar essa sugestão? 🙂
Na próxima semana, mais um pouco de Clean Code! Abraço!

Publicado originalmente em Blog André Celestino

André Celestino

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Desenvolvedor de software há 7 anos e autor do blog AndreCelestino.com. Graduado em Sistemas de Informação e pós-graduado em Engenharia e Arquitetura de Software com ênfase em Desenvolvimento Ágil. Atualmente trabalha como Engenheiro de Software.


4 Comentários

A H Gusukuma
1

Olá
Discordo!
Um desenvolvedor deve ser tratado primeiro como ser humano e depois como profissional.
Como voluntário, só se for voluntário.
Abraço

André Luis Celestino
2

Olá, A H Gusukuma! Obrigado por comentar!
Bom, minha vez de discordar! 🙂
O contexto do artigo é sobre ambiente corporativo, portanto, é focado mais no âmbito profissional dos desenvolvedores do que no pessoal. A ideia de “voluntário”, nesse quadro, é apenas uma analogia, e não uma prática.
Abraço.

Felipe Brandao
3

Parabéns pelo texto André.
Usamos nossa criatividade para desenvolver soluções ágeis e não receber um elogio por isso é complicado.
Fico feliz de ver que existem pessoas com esse conceito na área de TI.
Abraço.

André Luis Celestino
4

Olá, Felipe!
Pois é, infelizmente existem muitas empresas que praticam essa cultura de desconsiderar o reconhecimento dos desenvolvedores. Essas empresas devem compreender que a produtividade de um desenvolvedor está intimamente conectada com a motivação.
Obrigado pelo comentário!

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