O Analista que não lê

O foco do texto de hoje é sobre a função de Analista (de Requisitos, Negócios, Processos, Teste ou Sistemas), aquele responsável por identificar, compreender e especificar as necessidades (requisitos) do produto a ser executado (desenvolvido). Mas, poderia se estender a grande parte dos profissionais da área de Exatas, tendo em vista que conheço profissionais de outras profissões desta área que não gostam de ler e sempre ao serem indagados me respondem com o mantra: “Eu sou de Exatas, e não de Humanas, logo, não tenho que gostar de ler. ” – e, claro, discordo totalmente.

Todos nós, de Exatas, independente de sermos Analistas ou Programadores, nos expressamos muito mais com a comunicação escrita do que falada. Quer um exemplo? Pensem em quantos e-mails utilizamos para tratar de todos os assuntos e questões do nosso cotidiano.

Imagem via Shutterstock

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Ou seja, precisamos saber como nos expressar de forma clara, coesa, objetiva e que gere a menor dúvida ou ruído possível no receptor da nossa mensagem. E como conseguimos escrever bem? Lendo (muito e sempre).

Não me refiro a literatura técnica (livros didáticos, guias, manuais, metodologias, normas e outros), mas sim a narrativa de histórias (romances, biografias, dramas, ficção, política e qualquer outro gênero).

Durante minha carreira me deparei com certas escritas que me indignaram. A forma confusa, o vocabulário limitado, expressões coloquiais, redundância nas informações e falta de coerência que prejudicaram completamente a recepção e decodificação daquela mensagem.

Um caso de uso precisa facilitar a vida do Desenvolvedor (que o executará) e do Usuário (que o validará), portanto, a linguagem utilizada precisa ser muito bem aplicada para que um público tão distinto consiga compreender a única mensagem emitida no documento de forma correta. Portanto, se o Analista não estiver familiarizado com as mais distintas maneiras que existe para transmitir uma mensagem, contar uma história, ele dificilmente conseguirá encontrar um meio de se expressar com a objetividade e a clareza necessárias para atender a estes leitores diversos.

Eu sempre desconfio quando vou entrevistar um candidato para Analista de Requisitos que não tenha o hábito de ler, por isso a redação é fundamental para avaliar como ele se expressa por escrito, obviamente, isso não é uma regra, pois, conheço uma profissional que não gosta de literatura de nenhum gênero, mas, sabe se expressar por escrito de forma satisfatória (esse caso é uma exceção).

Ao meu ver, a leitura não nos permite apenas aprender a escrever melhor, como a analisar, interpretar de forma mais apurada, conseguimos considerar mais nuances dentro de um contexto, que talvez sem essa prática pudesse passar desapercebido.

O olhar crítico sobre a nossa escrita muda muito a medida que vamos adquirindo novos conhecimentos. E isso é fundamental ao nosso cotidiano, por exemplo, ao precisarmos comunicar sobre uma situação ao CEO e aos nossos pares não podemos redigir um único e-mail, porque provavelmente o CEO não terá tempo para ler um e-mail longo, cheio de detalhes, ele precisará de algo mais conciso, prático, claro para que leia e capte a nossa mensagem de imediato. Já aos nossos pares o detalhamento poderá ser feito (e, possivelmente, será lido) sempre problemas. Como conseguimos essa percepção? Através da prática da escrita e do aprendizado com a leitura.

Portanto, se você é um Analista – que precisa abstrair necessidades e repassá-las de forma escrita a outros papéis da cadeia de negócio – e não gosta de ler, o convido a fazer uma autorreflexão: “Quantas vezes seus documentos foram mal interpretados e você precisou reescrevê-los?”. E a você que é da área técnica e também não gosta de ler faço outro questionamento: “Quantas vezes seus e-mails foram interpretados de forma equivocada e você teve que falar pessoalmente para explicar o que tentou dizer por escrito? ”.

Depois que você encontrar essa resposta (e eu acho que não gostará muito dela) o convido a um desafio: leia ao menos um livro ainda este ano (de qualquer gênero literário – exceto técnico). Depois me diga se sua percepção e a forma de se expressar por escrito não melhorou (fique atento às idas-e-vindas das suas mensagens, observe se irão diminuir).

Tenho certeza que você só terá bons resultados.

Boa leitura. Sucesso na trajetória!

Carolina Souza

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Psicóloga (CRP 06/203773) e Especialista em Gestão de Projetos (PMP) atua há décadas no mundo empresarial. Certificada CPRE, SFC, ITIL com profunda experiência nas áreas de Engenharia de Requisitos, Análise de Processos e Desenvolvimento de Equipes de Alta Performance. Palestrante. Colunista no PTI desde 2013 sempre colaborando com artigos focados no desenvolvimento profissional dos leitores e gerentes de projetos em início de carreira.

Conecte-se com a autora em seu perfil no Linkedin e continue aprendendo sobre como crescer em sua carreira.


23 Comentários

Abian Laginestra
1

Carolina,
Excelente artigo.
Parabéns. Descreveu uma realidade muito pouco explorada pelas pessoas atualmente, em seu desenvolvimento.

Tiago O. Procópio
2

Carolina
Lidar com diferentes níveis de usuários exige muito “jogo de cintura” (sou analista de suporte). Porém, quando se fala em escrita ou é 8 ou 80. Documentos, emails, apresentações, dentre outros, exige muito mais do que imaginamos.
Ainda temos a terrível fama de ser aqueles que resolvem os problemas, sendo que, devemos ir muito além da simples técnica milagrosa. Conheço excelentes profissionais com um currículo invejável, mas que não sabem se expressar através de um email.
Parabéns pelo artigo. Mas não acho necessário ler um livro de literatura para ter uma boa escrita. Creio que a leitura de jornais, artigos, livros didáticos já é o suficiente.
Mas deixo uma pergunta:
Se mal sabemos o português, como mergulhar de cabeça no inglês? (para o profissional de TI isso deveria ser o básico do básico).
Tiago
Curitiba/PR

Marcelo Dias
3

Excelente artigo, Carolina. Estamos cada dia mais encontrando pessoas pessoas ruins no mercado que se acham profissionais por que tem um diploma. Aí você pede ao cara pra redigir um email e o mesmo mal sabe escrever.
Eu já ouvi e muito a frase que você citou do “eu sou de exatas, não preciso ficar lendo”, mas creio que ainda ficará mais complicado nos próximos anos.

Renata
4

Carolina,
Gostei do tema abordado neste artigo. Vejo também muitos profissionais de TI escrevendo mal… às vezes me pergunto como passaram pela universidade. Além de textos confusos, sem pé nem cabeça, vejo também muitos erros de ortografia.
Conforme você abordou, não é só o cargo de analista de requisitos que precisa ter uma boa escrita, os profissionais de suporte também, afinal precisam explicar com clareza o funcionamento do sistema e dar direcionamento correto aos usuários.
abs

Carolina Souza
6

Olá Renata,
Ainda existe essa questão abordada por você, da escrita confusa e errada. O que só prejudica a comunicação entre as pessoas. Acho que a leitura também pode contribuir para solucionar isso, pois, uma vez atentos a leitura acabamos aprendendo a forma correta da grafia das palavras.
Obrigada pelo comentário e por compartilhar sua experiência conosco.
Abraços.

Carolina Souza
8

Olá Tiago,
Obrigada pelo comentário.
A leitura técnica ajuda, sem dúvida. Mas, para desenvolver a habilidade de análise, talvez a literatura não técnica possa contribuir mais. E quanto ao inglês também penso que só é possível desenvolver tendo domínio do idioma nativo. Senão, fica mais difícil desenvolver o raciocínio em outra língua.
Abraços.

Ricardo Lima
9

Parabéns pelo artigo Carolina,
Estou iniciando como analista de requisitos jr, não é que eu não goste de ler, só tenho um pouco de preguiça mesmo, mas seu texto me deu uma reflexão realmente da importância disso na minha carreira como analista agora. E claro vou buscar encaixar bem suas ideias a minha vida, o que já deveria ter feito.
Att.

Renato
11

Ótimo texto Carolina, parabéns pela colocação. Muitos profissionais se julgam o “sabichão”, mas mal sabem escrever um e-mail direcionado a alguém da forma correta. A leitura é a porta para a sabedoria.

Carolina Souza
12

Olá Ricardo,
É bem comum quem ainda não tem o hábito da leitura ter preguiça para começar, fique tranquilo que você não está sozinho nessa 🙂
O importante é adquirir esse hábito por prazer e não por obrigação, por isso é essencial descobrir qual tipo de literatura mais lhe agrada. O que fazemos com alegria e satisfação gera um resultado muito mais promissor do que aquilo que fazemos por obrigação.
Boa leitura.
Obrigada pelo comentário.
Abraços.

Carolina Souza
13

Olá Renato.
Obrigada pelo comentário 🙂
Você tem razão, há ‘sabe-tudo’ em todas as partes, mas na hora da necessidade poucos são os que realmente se garantem. E a leitura é mesmo uma fonte de sabedoria.
Abraços.

Weiner
14

Boa tarde, Carolina.
excelente artigo muitas vezes priorizamos a parte técnica, e nos esquecemos de quão é importante a leitura independente da área de atuação. fui um leitor assíduo hoje nem tanto, mas aos poucos vou resgatando isso. Tenho certeza que seu artigo abriu a mente de muitas pessoas inclusive a minha.
att…

Ronan Diniz
15

Obrigado pelo artigo Carolina!
Me deixa ainda mais convicto de que a leitura é essencial. Um recurso que costumo usar, e me ajuda muito, é o Dicionário. Pode parecer simples, mas, sanar uma dúvida com determinada palavra ou até mesmo abrir o dicionário ao acaso para aprender uma palavra nova aumenta as opções na hora de escrever.
Parabéns!

Genizis
16

Excelente texto, Carolina.
A comunicação sempre será a melhor ferramenta para um ótimo trabalho, sendo ela em forma verbal ou escrita.
Parabéns!
Abraço.

Carolina Souza
17

Olá Weiner,
Fico feliz por ter lhe incentivado a resgatar o hábito da leitura.
Obrigada pelo feedback.
Abraços.

Carolina Souza
18

Olá Ronan,
É verdade eu gosto muito de ler no kindle, então o dicionário está sempre à disposição 🙂 adoro!
Obrigada pelo comentário.
Abraços.

Carolina Souza
19

Olá Genizis,
Comunicar é se relacionar. E precisamos muito dela para desempenhar um bom trabalho como você falou.
Obrigada pelo comentário.
Abraços.

Ivan
20

Carolina,
Este artigo só me faz incentivar o costume da leitura, mas não ler só porque faz bem, mas encontrar o prazer na leitura, expandir o conhecimento, melhorar o fluxo de pensamento. Algumas leituras são maçantes, difíceis de “digerir”, então o sono logo bate à porta, mas se configuram material cobrado p/ ser aprovado em exames, concursos, aí é preciso utilizar a criatividade para encaixar o conteúdo em nosso dia-a-dia.
Eu tenho muitas dificuldades com material extenso pois fico disperso rápido, mas me policio e persisto para cumprir a meta de leitura do dia.

Adriano
21

Excelente artigo!
Sou analista de documentação e trabalho no setor de universidade corporativa de uma empresa de TI.
A maioria dos pontos abordados neste artigo são justamente o que estamos vivenciando no momento, tanto que implantamos um comitê de melhoria de processos. Porém, a discussão sobre a importância da “clareza” na comunicação ainda está tímida, com algumas “resistências”.

Carolina Souza
22

Olá Adriano.
Muito bom saber de empresas que se preocupam com a documentação e a clareza nos requisitos.
Talvez uma boa ferramenta para ajudá-los nesse comitê fosse a prática de dinâmicas em pequenos grupos a fim de demonstrar com situações reais o resultado de um trabalho utilizando os requisitos não tão claros e como poderia ter sido se adotassem mais objetividade nas especificações (redução de retrabalho, maior qualidade, economia de tempo e esforço, dentre outros).
A ideia seria envolver mais os analistas dos diversos setores, tornando esse processo de conscientização inclusivo e diminuindo a resistência, uma vez que os colaboradores se sintam envolvidos no processo.
Obrigada pelo comentário.
Boa sorte e sucesso.
Abraços.

Carolina Souza
23

Olá Ivan.
Parabéns pela persistência! É isso mesmo, algumas leituras são obrigatórios e cansativas, para combater esses problemas só com muita criatividade e perseverança.
Continue nesse caminho, que certamente terá bons resultados.
Obrigado pelo comentário.
Abraços e sucesso.

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