Potência Real ou Nominal? Desmistificando as “Fontes Reais”

*Por Charles Blagitz

Há mais 10 anos, os computadores pessoais eram montados somente por aquelas pessoas que dominavam a dificílima arte de combinar partes complexas, inúmeras “STA’s” (Soluções Técnicas Alternativas) e a complicada arte de “caçar” drivers e fazer funcionar placas, dispositivos que eram do tipo “plug&pray” (conecte e reze, literalmente) e o próprio sistema operacional, nada amigável naquela época.

Com a popularização dos computadores e os avanços nos sistemas operacionais (Windows Vista, Windows 7), essa tarefa de instalar hardwares se tornou muito mais fácil e simples. Tanto que abriu o mercado de montagem de máquinas para quem quisesse se arriscar a montar um computador simples ou mesmo uma potente máquina de jogos.

Se por um lado isso é extremamente positivo, massificando o uso do computador pessoal, por outro lado é ruim, pois ignora alguns conceitos técnicos aos quais os novos “montadores de micro” nunca foram apresentados. E, infelizmente, o mercado acompanha essas mudanças, muitas vezes de forma incorreta, apenas para atender à necessidade de vender cada vez mais.

Sinto que precisamos derrubar paradigmas errados, incorretos, e criar novos, dessa vez obedecendo aos critérios técnicos e, ao mesmo tempo, levando esse conhecimento aos novos usuários-técnicos.

Nosso primeiro paradigma: fonte real e nominal. Esse contexto foi, e ainda é, usado como discurso de mercado. Uma fonte é nominal quando ela mostra ‘uma certa’ potência em Watts mas que nunca consegue atingir, e é real quando ela consegue entregar a potência declarada, mesmo que por um tempo não muito longo (valor de “pico”). Devemos enterrar de uma vez por todas essa classificação.

Já é tempo de não mais adotarmos a classificação “nominal”, pois, em termos práticos, ela nada diz sobre a fonte de alimentação.

Para criarmos um novo paradigma das fontes, antes é necessário entendermos o que é, afinal de contas, essa tal de “fonte de alimentação para PC padrão ATX2.2”. Vamos começar antes com um exemplo mais conhecido: seu carro. Ao abrir o capô do seu veículo, você encontrará lá no canto a bateria (exceto se o seu carro for um fusca, porque aí a bateria vai estar debaixo do banco traseiro). Essa bateria tem duas especificações: ela é de 12V (algo já padrão no mercado) e tem um tal de “Ampére-hora”. Mas o que é esse Ampére-hora? Basicamente, a corrente máxima que ela consegue entregar ao carro.  Se ela é de 60A, significa que ela vai disponibilizar para o seu carro no máximo 60A. Não queira ligar geladeira, ar condicionado e o sistema de som mega-super-power que você comprou na Duque de Caxias no último sábado junto com o farol alto, porque sua bateria não vai aguentar. Ela vai “arriar”, no jargão popular. Tudo deve ser compatível e coerente. A necessidade de corrente total do seu carro deve ser inferior à corrente máxima que a bateria pode fornecer. Esse é o primeiro conceito que devemos levar em conta.

O segundo ponto é como olhamos para a bateria do seu carro. Ela é de 12V. Até aí, entendido. E, conforme o modelo do seu carro, ela pode ser de 60 ou 70A. Mas digamos que você ganhou um aumento e comprou um novo sedan, cheio das coisas e frescuras como freios ABS, controle de tração, som super-potente. Ela será então de 70A. Existe uma lei na eletrônica muito simples e que é aplicada nesse momento:a lei de Ohm. Ela diz que se multiplicarmos a tensão (os 12V) pela corrente (os 70A) teremos uma tal de Potência, medida em Watts. Então, ao executarmos a conta “12 x 70” obteremos 840 Watts. Agora, imagine você indo até uma loja de autopeças e pedindo uma bateria automotiva de 840 Watts. No mínimo, o vendedor vai dizer que não trabalha com baterias importadas (caso verídico, não riam).

Esse cálculo foi muito simples, porque temos apenas uma única tensão e uma única corrente. Mas vamos voltar aos computadores.

Os microcomputadores atuais possuem uma série de periféricos, dispositivos e componentes que precisam de diferentes tensões de funcionamento como 12V, 5V, 3.3V, -12V, etc. Isso parece um tanto “mal pensado”, mas é a realidade. Memória, CPU, discos rígidos, placas de vídeo: cada componente tem uma necessidade de tensão e corrente diferentes porque cada componente tem sua necessidade para poder funcionar, assim como qualquer eletrodoméstico (uma geladeira precisa de uma certa corrente e tensão para poder funcionar, por exemplo).

E é nesse ponto que temos o primeiro grande problema: se temos 5, às vezes até 6 tensões diferentes, e cada qual com sua corrente máxima disponível, como podem então dizer que uma fonte de PC tem, digamos, 500 Watts? Em termos técnicos isso não é possível. Então, de onde vem essa nomenclatura, amplamente usada no mercado? Alguns fabricantes, para facilitar a compreensão por parte dos clientes, resolveram “somar” os valores de potência de cada uma das tensões internas e, com isso, apresentar um valor “inflado”, maior do que aquele único número mirradinho. Imaginem se adotassem a potência da tensão de 5V: a fonte teria 120, 130 Watts. Seguindo esse raciocínio, a potência de uma fonte é a soma das potências nas linhas de 12V, junto com a de 5 ou de 3.3V, aquela que for maior. Só para exemplificar, imaginemos uma fonte com os seguintes valores:

Fonte “exemplo”   = 12V, corrente máxima de 22A = 264 Watts
= 5V, corrente máxima de 15A = 75 Watts
= 3.3V, corrente máxima de 25A = 82,5 Watts (valor maior)

A potência dessa fonte será então de 264 + 82,5 = 346,50 ou 350 Watts arredondando.

Curioso é que, se a fonte tem “350W” de potência, nunca poderemos conectar à ela uma placa de vídeo que demande por exemplo 300 Watts. As placas de vídeo demandam maior corrente na sua linha de 12V, e nessa fonte exemplo temos uma máxima de 264W que ainda devem ser distribuídos para discos rígidos, cd rooms, processadores e outros periféricos da placa mãe. Portanto, a potência de 350W não pode ser usada para determinar se a fonte é suficiente para tal configuração ou não. E esse é o motivo desse artigo.

Para facilitar a compreensão, e ao mesmo tempo ser tecnicamente correto, implementamos os termos “potência combinada operacional”“potência combinada máxima”.

Vamos definir cada um desses termos:

  • Potência combinada operacional: é a potência obtida da soma das potências individuais das linhas de 12V e de 3.3V (ou da de 5V se essa for maior), mas que estejam dentro da faixa de operação ideal da fonte. Esse patamar de potência poderá ser utilizado continuamente, sem prejudicar a vida útil estimada da fonte. Ninguém, em seu juízo perfeito, quer uma fonte que dure 1 semana ou menos.
  • Potência combinada máxima: é a potência obtida da soma das potências individuais das linhas de 12V e de 3.3V (ou da de 5V se essa for maior), mas que estejam próximas das faixas máximas (ou limite) de operação da fonte. Esses patamares, quando atingidos, poderão acarretar uma redução drástica da vida útil da fonte provocando aquecimentos de seus componentes internos e, em muitos casos, reduzindo a sua eficiência (eficiência é o quanto a fonte consegue converter da entrada AC para as saídas DC sem desperdício).

Entendemos que esses dois termos irão produzir um efeito muito positivo na adoção das fontes corretas pelos usuários, garantido uma maior longevidade a ela. Mas voltemos aos termos Real e Nominal. Esse último, valor que era superinflado pela soma de todas as potências existentes na fonte (soma das potências de cada uma das tensões internas), já não é mais considerado na prática pelo mercado e está em franco declínio. O que devemos observar com cuidado agora é a tal potência Real das fontes. O que significa afinal uma fonte real? Será ela capaz de entregar toda a potência informada na sua embalagem? A resposta sempre será “depende”. Claro que existem fontes no mercado “maquiadas”, mas tudo é uma questão de cenário. Ao se aplicar uma carga em uma fonte de alimentação, ela pode assumir uma série de configurações, contendo mais carga em 5V ou em 12V, tendo mais discos rígidos ou uma placa de vídeo de alta performance. Um teste de fontes é um procedimento complexo e que exige a adoção de critérios técnicos bem definidos.

Mas como aqui a idéia é desmistificar e não complicar, adotamos o termo potência combinada operacional, pois é o que irá, sem sombra de dúvida, proteger o investimento do comprador da fonte, permitindo que ela trabalhe com folga dentro dos parâmetros nos quais ela foi projetada para funcionar. É o mesmo pensamento quando se compra um carro. Na loja, o vendedor até pode dizer que tal modelo atinge 200Km/h. Realmente, ele pode atingir tal velocidade “máxima” mas, se usado com muita freqüência,  fatalmente o motor não vai resistir. Entretanto, se utilizarmos o veículo rodando a 120Km/h, a vida útil do motor será excepcionalmente longa. Podemos então fazer a analogia com as fontes de alimentação: a velocidade de 200Km/h seria a “potência combinada máxima” e a velocidade de 120Km/h seria a “potência combinada operacional”.

Existem várias calculadoras de fontes na internet, a maioria gratuita, que ajudam muito no processo de escolher a fonte ideal para o seu computador (exemplo:http://extreme.outervision.com/psucalculatorlite.jsp). Como a grande maioria das pessoas que hoje monta micros não possui formação em eletrônica, e isso é uma realidade, é imprescindível a consulta a essas calculadoras ou, então, em uma situação ideal, consultar um técnico ou um engenheiro. Mas, via de regra, sempre procure adotar fontes maiores e mais dimensionadas para suas configurações. Uma fonte quando usada abaixo de seus limites, irá durar muito mais tempo sem deixá-lo na mão.

*Charles Blagitz é gerente de marketing da fabricante brasileira de periféricos Coletek, detentora da marca C3 Tech.

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7 Comentários

Robson
1

Gostei do artigo Charles, bem esclarecedor. Fiz o calculo no site e vi que minha fonte (CoolerMaster ATX Elite Power 460W RS-460) está atendendo com folga.

Jorge
3

Eawe Fernando,pode me dizer o q é,e o q consta a lei de Ohm?
até onde eu sei tá certinho o exmplo dado aí no artigo do Charles.

Brian
4

Essa formula ateh existe. potencia = tensao * corrente. Mas isso nao eh ohm..
ohm eh resistencia, e nao potencia.
Resistencia(ohm)= tensao/corrente.
ta errado mesmo hahaha =x

Ignácio Tesche Paim
5

Há um pequeno grande equívoco no raciocínio no que tange as grandezas envolvidas. Não existe baterias de 40 ou 60 Amperes. O que existe são baterias de 40Ah (Ampere hora) ou 60 Ah(Ampere hora). Podemos traçar um paralelo: Km (quilômetro) é unidade de distância, Km/h (quilômetro por hora) é unidade de velocidade. Ampere (A) é unidade de corrente elétrica (Ah) é unidade de consumo de corrente elétrica em determinado tempo). O motor de arranque modelo ZM 8010604 que equipa os veículos Blazer, Monza e Kadett da GM tem uma potência de 0, 95 Kw, ou seja 950w, o que implica em uma corrente de 950W/12V= 79A. Isso mesmo 79 A. Uma bateria de 12V pode fornecer muito mais que 60A, podendo chegar a valores superiores a 300A que é a corrente máxima de partida a frio. Essa corrente está limitada pelas características intrínsecas da bateria como dimensionamento, capacidade de dissipação, etc…Quando alguém te diz que sua bateria é de 60A, faltou completar: 60Ah, ou seja, essa bateria, quando totalmente carregada (bateria nova, pois com o tempo a sua capacidade de carregar vai diminuindo), pode fornecer a uma carga de 6A dez horas de funcionamento, a uma carga de 12A cinco horas de funcionamento. Nos ensaios de fábrica, para evitar super aquecimento usa-se o padrão 10 horas de funcionamento.

Ignácio Tesche Paim
6

Detalhe importante: A corrente elétrica de 79A do motor de arranque leva-se em consideração que ele está girando, pois no momento da partida, com o motor parado e ausência da força contra-eletromotriz, a corrente eletrica é bem maior.

Jean
7

Artigo excelente, acho q envelheceu muito bem com o passar dos anos, as informações permanecem coerentes até hoje. Me ajudou muito, obg!

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