Quarta Revolução Industrial e o Brasil com isso?

Muito se lê a respeito da Quarta Revolução Industrial, onde acontecerá uma integração entre as tecnologias (já bem explicado no post do Eduardo Harada) e como ela vai modificar a forma como a indústria funciona, principalmente quando se refere aos empregos que irão desaparecer e novos empregos que serão criados.

De fato, duas visões antagônicas permeiam as pesquisas e relatórios mundiais. Por um lado, defende-se que as pessoas viverão um desemprego em massa e bilhões de pessoas no mundo não terão capacidade de trabalhar em lugar algum, por outro, se diz que novos empregos surgirão e as vagas que serão criadas ultrapassam as que deixarão de existir.

Vamos à primeira hipótese… Uma análise feita pela PwC aponta que por volta de 30% dos empregos no Reino Unido serão afetados pela mudança da indústria até 2030. Esse mesmo relatório também aponta que países como Estados Unidos (38%), Alemanha (35%) e Japão (21%) também terão suas economias afetadas nos próximos anos. Obviamente, o impacto nos empregos não será distribuída de forma proporcional e afetará, principalmente, a parte mais pobre da população, pois a variação do impacto previsto no Reino Unido está entre 12% dos empregos de nível superior até 46% nos empregos de pessoas com nível médio incompleto.

Dessa forma, o relatório exemplifica que trabalhos cuja função seja feita de forma repetitiva serão extintos, ao passo que as funções criativas terão menor chance de serem extintas. Entre as profissões repetitivas entram cargos como porteiros, motoristas, atendentes de telemarketing e até mesmo analistas de investimentos, analistas financeiros, corretores de seguros, assistentes jurídicos entre outras. Claro que essas profissões não irão desaparecer da noite para o dia, mas serão progressivamente substituídas por soluções de inteligência artificial.

Exemplos dessa mudança podem ser vistas nos dias de hoje com a nova fábrica da Adidas na Alemanha. A fábrica está totalmente automatizada com robôs autônomos e impressoras 3D, onde a expectativa de produção está em 500.000 pares por ano. Essa fábrica é apenas um teste, mas a ideia da Adidas é trazer a produção de volta à Alemanha, lugar onde serão vendidos os tênis, dessa forma ela economiza com a logística de entrega para as lojas. É claro que a fábrica não funciona sozinha, mas a quantidade de mão de obra é consideravelmente menor se comparada com as fábricas da Ásia. Abaixo está a foto de um robô que faz os tênis Adidas – Fonte: Economist.

Robô na fábrica da Adidas

Robô na fábrica da Adidas

A respeito das profissões criativas, há alguns relatórios que defendem que elas não sofrem alto risco de extinção, mas é difícil acreditar que essas profissões não terão um grande impacto quando se vê algo como a música “Daddy Car” – Primeira música pop criada por uma Inteligência Artificial baseada em Beatles, ou quando lemos o artigo “DeepBach: a Steerable Model for Bach Chorales Generation” que apresenta um algoritmo de machine learning capaz de compor corais altamente convincentes baseando-se em Johann Sebastian Bach.

Bom, vamos parar de chorar e ver o lado bom da coisa

Na segunda hipótese, os economistas dizem que as revoluções industriais já vêm transformando e criando novos empregos durante todo o andar da história e que a mudança para a nova indústria 4.0 será positiva uma vez que serão criados novos empregos. Nesse ponto, uma pesquisa divulgada no MIT Sloan Management Review apresenta novas profissões que irão surgir nessa nova fase da industrialização.

Essa pesquisa foi feita com mais de 1.000 empresas onde foram identificadas três categorias de novos empregos denominados trainers (treinadores), explainers (intermediadores) e sustainers (suporte). Os trainers serão pessoas que treinarão o comportamento dos robôs e sistemas de inteligência artificial. Os explainers serão profissionais capazes de fazer a ponte entre a tecnologia e os líderes de negócios, nesse grupo podemos encontrar os analistas de transparência. Por fim, os sustainers, esses profissionais terão o papel de assegurar que as tecnologias irão trabalhar conforme projetado, aqui o gerente de compliance é importantíssimo, assim como os eletricistas e mecânicos de automação.

Além dessas novas profissões podemos ver várias áreas de suporte e auxílio às indústrias surgindo, onde pode-se ver startups com propostas de automatizar a produção, elevando níveis de competitividade das empresas. Aqui no Brasil podemos exemplificar as startups que estão fornecendo o serviço de agricultura preditiva, entre outras.

Apresentado essas duas hipóteses pode-se imaginar uma onda de pessoas desempregadas em um primeiro instante, mas que serão absorvidas em outras funções com o passar do tempo, seja em funções técnicas, criativas ou humanas.

Bom, e o Kiko? Brasil?

Em geral, países desenvolvidos exportam produtos manufaturados e tecnologias com alto valor agregado, por sua vez, países subdesenvolvidos exportam produtos primários. Por aqui temos os dois cenários, pois o Brasil é um país que exporta de soja a avião, o problema é que a maior parte da nossa balança comercial é composta de produtos básicos e semimanufaturados.

Observando melhor o nosso exemplo, percebe-se que a produção de soja no último ano representou 14% da exportação na nossa balança comercial, enquanto que a exportação de produtos de alta tecnologia representa hoje 4,24%. De fato, nossa exportação total de produtos industrializados fica em torno de 36%, incluindo produtos de alta tecnologia. Nesse mesmo cenário, pode-se notar que os produtos básicos e semimanufaturados representam por volta de 64% da balança comercial e essa parte da produção possui tarefas as quais são facilmente automatizadas. (Recomendo visualizar os gráficos de Exportações Brasileiras por Intensidade Tecnológica). Fonte: MDIC

Exportações por Intensidade Tecnológica

Exportações por Intensidade Tecnológica

Além disso, ao mesmo tempo que a nova revolução acontece, o Brasil vive um desemprego conjuntural de 12.7%, causado pela crise econômica, e é muito provável que empresas e fazendas automatizem seus equipamentos nos próximos 10 ou 15 anos e a partir desse momento seus motoristas, porteiros e afins terão que se reinventar e buscar outras profissões, ou seja, nos próximos 10 anos o Brasil ainda terá que lidar com uma onda de desemprego estrutural causado pela mudança na indústria.

Para contornar esse cenário, o governo poderia investir em ciência, pesquisa e tecnologia, ao mesmo tempo que faz reajustes fiscais e incentiva o crescimento da indústria e das empresas. Claro que nossa indústria de tecnologia está fazendo o melhor que pode, pois em São Paulo é possível ver inúmeras startups aproveitando o momento para criar novos negócios.

O ponto que quero chegar aqui é: O Brasil pode se tornar um país que vende soja e compra tratores autônomos ou pode aproveitar a nova revolução industrial para incentivar a educação, a ciência, o desenvolvimento tecnológico para que novas empresas de tecnologia consigam suprir esse novo mercado.

Fato é que a indústria sozinha não conseguirá absorver todas as pessoas desempregadas pela revolução, caso elas não tenham nenhum tipo de preparo, por isso também é necessário planejamento e investimentos sérios em setores estratégicos por parte dos governantes, para que assim as pessoas tenham mais chance de estudar, se desenvolver e conseguir uma nova posição no mercado.

Referências

Indústria 4.0: entenda quais são as tecnologias e os impactos da Quarta Revolução Industrial
www.profissionaisti.com.br/2019/02/industria-4-0-entenda-quais-sao-as-tecnologias-e-os-impactos-da-quarta-revolucao-industrial/

Profissões da Quarta Revolução Industrial
exame.abril.com.br/carreira/estas-profissoes-podem-acabar-ate-2030-ao-menos-para-os-humanos/

Robôs e empregos
exame.abril.com.br/economia/robos-podem-matar-um-terco-dos-empregos-ate-2030-segundo-pwc/

Relatório da PwC
www.pwc.co.uk/economic-services/ukeo/pwc-uk-economic-outlook-full-report-march-2017-v2.pdf

Inteligencia Artificial e Predição
www.sciencemag.org/news/2018/06/artificial-intelligence-can-predict-how-you-ll-look-decades-now

Fábrica da Adidas na Alemanha
www.economist.com/business/2017/01/14/adidass-high-tech-factory-brings-production-back-to-germany

DeepBach: a Steerable Model for Bach Chorales Generation
arxiv.org/pdf/1612.01010.pdf

Daddy Car
www.youtube.com/watch?time_continue=87&v=LSHZ_b05W7o

Profissões que a Inteligência Artificial irá criar
ilp.mit.edu/media/news_articles/smr/2017/58416.pdf

Balança Comercial Brasileira
www.mdic.gov.br/comercio-exterior/estatisticas-de-comercio-exterior/comex-vis/frame-brasil

Exportações Brasileiras por Intensidade Tecnológica
www.mdic.gov.br/comercio-exterior/estatisticas-de-comercio-exterior/comex-vis/frame-siit

Adriano Ferruzzi

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Analista de Sistemas com especialização em administração em banco de dados. Atualmente trabalho com Computação de Alto Desempenho na Unicamp no Centro de Computação Engenharia e Ciência. Além de um estudande curioso de economia e história.


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